Ano bissexto
Um fato que muita gente não sabe é que o pessoal que foi dormir em 4 de outubro de 1582 teve o maior sono da história. Os que não morreram acordaram no dia 15 de outubro de 1582. Imaginem, então, quem estava tendo pesadelo. Que pesadelo!
O leitor pode pensar que se trata de um trecho de conto de ficção. Nada disso. O fato é que, para acertar o calendário, isso realmente aconteceu. Na verdade, o pessoal que dormiu no dia 4 de outubro (quinta-feira) daquele ano acordou no dia seguinte mesmo (sexta-feira), mas com a data de 15 de outubro. Sabe-se lá como ficaram os compromissos marcados entre essas datas, casamentos, aniversários, etc.
Essa e outras mudanças ocorreram para o estabelecimento do calendário que ainda hoje utilizamos: o calendário gregoriano.
O início dessa história toda se perde no tempo.
O homem começou a marcar o tempo há milhares de anos e das mais diversas formas, das quais veremos algumas através de comentários sucintos sobre um assunto bastante complexo: o calendário. Seu aprimoramento deveu-se muito à contínua evolução dos conceitos matemáticos.
Calendário provém de calendas, que era a designação de uma etapa da marcação do mês utilizada pelos romanos. Ou seja, o mês romano era dividido em três partes: calendas, nonas e idas, correspondendo respectivamente ao início, ao quinto ou sétimo dia, e ao meio do mês. Um sistema bastante confuso que, enigmaticamente, perdurou por muito tempo. E, mesmo assim, os romanos achavam que confuso era o sistema utilizado pelos gregos, o que é evidenciado até hoje pela frase “foi para as calendas gregas”, usada para caracterizar um evento sem data definida ou que supostamente nunca acontecerá. Coisa ainda corriqueira em nosso país, caracterizada pelas promessas do imenso contingente que temos de adeptos do calendário grego – a maioria dos nossos políticos.
Dentre as diversas formas de marcar o tempo, o calendário lunar é provavelmente a mais antiga, em decorrência da fácil constatação da regularidade das fases da lua. O mês era calculado pelos astrônomos dos povos antigos de várias formas: como o tempo entre duas luas cheias, ou o número de dias necessários para que a lua desse uma volta ao redor da Terra, etc. Isso corresponde a aproximadamente 29,5 dos nossos dias. Doze desses períodos é um ano lunar com, portanto, 354 dos nossos dias.
A adoção de 12 ciclos provavelmente decorreu de influência dos babilônios (habitantes do atual Iraque – que tragédia!), que adotavam o sistema sexagesimal com um calendário de 12 meses lunares, arredondando cada mês para 30 dias. O ano para os babilônios, portanto, correspondia a 360 dias.
A influência da base 60 dos babilônios persiste até hoje nas medições angulares e na divisão da hora. A própria divisão do dia em 24 horas é também conseqüência da base 60.
E qual era o problema da adoção desses sistemas?
A encrenca com esses e outros sistemas, que não o referenciado ao sol, é que ao longo do tempo se perdia a correspondência com as estações do ano. Era, exagerando, como se, com o passar do tempo, um dado dia do ano previsto para o verão caísse em pleno inverno. As férias de um sorocabano em Mongaguá poderiam cair na época de um frio medonho. Já pensou? Bermudão, chinelos de dedo, camiseta regata, bóia e um baita frio. Nem pensar!
Teoricamente, se não houvesse a tal sazonalidade, qualquer sistema de marcação de tempo poderia ser arbitrado. É por causa das estações que até hoje fazemos uma correção no calendário de quatro em quatro anos, nos tais anos bissextos.
Os gregos que adotaram o calendário lunar já sabiam dessa falha e periodicamente adicionavam meses para a concatenação com as estações, o que também era feito pelos babilônios.
O problema da inclusão de meses adicionais para acertos é que ela era feita por “sacerdotes”, cheios de poder político e vaidade, como sói acontecer... E, como todo poder perverte, as coisas ficavam arbitrárias. Muitas vezes as correções eram esquecidas e virava uma bagunça com chiadeiras, sobretudo dos agricultores.
Daí concluirmos que as mutretas vêm de longe... São, em essência, atávicas na humanidade.
A mesma coisa acontecia com o calendário romano, que inicialmente era lunar, com 304 dias divididos em dez meses, de março a dezembro. Naquela época, o ano começava em primeiro de março. Posteriormente, Numa Pompilius (715-673 a.C.) acrescentou mais dois meses – janeiro e fevereiro –, fez alterações e estabeleceu o ano com 354 dias.
Tarquinius Priscus (616-579 a.C.), por superstição aos números pares, deu um dia a mais a janeiro e o sistema passou a ser de um ano com doze meses e 355 dias.
Posteriormente, Julio César, influenciado pela cultura egípcia, promoveu nova reforma, que foi realizada pelo astrônomo alexandrino Sosígenes. Adotou-se então um calendário com 365,25 dias do ano solar (365 dias mais um quarto de um dia).
A diferença de 6 horas entre o ano solar e o ano civil adotado era ajustada de 4 em 4 anos, repetindo-se o dia 24 do mês de fevereiro, que na época tinha 29 dias. Esses anos de 366 dias chamam-se bissextos porque os romanos repetiam o dia 24 de fevereiro "bis VI antediem calendas martias". Simplificadamente “bis VI”, ou “bissextum”. Daí a origem do ano bissexto – duas vezes o sexto dia antes do início de março – e não, como muita gente atribui, ao duplo seis em 366.
O começo do ano mudou de 1o de março para 1o de janeiro. Mudou-se também o nome do antigo quinto mês do ano, "quintilius", para julho (Julius) em homenagem a Júlio César, e mais tarde o sexto mês, "sextilius", passou para o que hoje é agosto (Augustus) em homenagem a Otávio César Augusto. Como julho tinha 31 dias, por razões políticas o mês de agosto passou a ter também 31 dias, com a diminuição de um dia de fevereiro, que ficou, em anos normais, com 28 dias.
Todavia, o tal do calendário juliano era maior que o ano solar em 11minutos e 14 segundos (um ano solar ou trópico tem 365 dias, 5 horas, 48 minutos e 45,5 segundos, que, para facilitar o entendimento, vamos considerar como o período que corresponde à revolução da Terra em torno do Sol).
Para corrigir esse erro entre o ano solar e o ano civil, que no ano de 1582 já era de 10 dias, o Papa Gregório XIII, pela sua Bula Inter Gravissimas de 24 de fevereiro de 1582, ordenou a reforma do Calendário para um ano trópico de 365,2425 dias.
Com essa reforma, permanecem os anos bissextos de 4 em 4 anos (fevereiro com 29 dias, como o do ano de 2004). Todos os anos seculares são anos normais (1700, 1800, 1900, etc.), exceto os divisíveis por 400 (1600, 2000, etc.), que são anos bissextos.
Foi para promover essa correção que o dia seguinte a 4 de outubro de 1582 (quinta-feira) passou a ser o dia 15 de outubro de 1582 (sexta-feira), como comentamos inicialmente.
Todavia, o calendário que usamos não é absolutamente exato. Daqui a uns 3000 anos haverá uma diferença de um dia!
O leitor pode pensar que se trata de um trecho de conto de ficção. Nada disso. O fato é que, para acertar o calendário, isso realmente aconteceu. Na verdade, o pessoal que dormiu no dia 4 de outubro (quinta-feira) daquele ano acordou no dia seguinte mesmo (sexta-feira), mas com a data de 15 de outubro. Sabe-se lá como ficaram os compromissos marcados entre essas datas, casamentos, aniversários, etc.
Essa e outras mudanças ocorreram para o estabelecimento do calendário que ainda hoje utilizamos: o calendário gregoriano.
O início dessa história toda se perde no tempo.
O homem começou a marcar o tempo há milhares de anos e das mais diversas formas, das quais veremos algumas através de comentários sucintos sobre um assunto bastante complexo: o calendário. Seu aprimoramento deveu-se muito à contínua evolução dos conceitos matemáticos.
Calendário provém de calendas, que era a designação de uma etapa da marcação do mês utilizada pelos romanos. Ou seja, o mês romano era dividido em três partes: calendas, nonas e idas, correspondendo respectivamente ao início, ao quinto ou sétimo dia, e ao meio do mês. Um sistema bastante confuso que, enigmaticamente, perdurou por muito tempo. E, mesmo assim, os romanos achavam que confuso era o sistema utilizado pelos gregos, o que é evidenciado até hoje pela frase “foi para as calendas gregas”, usada para caracterizar um evento sem data definida ou que supostamente nunca acontecerá. Coisa ainda corriqueira em nosso país, caracterizada pelas promessas do imenso contingente que temos de adeptos do calendário grego – a maioria dos nossos políticos.
Dentre as diversas formas de marcar o tempo, o calendário lunar é provavelmente a mais antiga, em decorrência da fácil constatação da regularidade das fases da lua. O mês era calculado pelos astrônomos dos povos antigos de várias formas: como o tempo entre duas luas cheias, ou o número de dias necessários para que a lua desse uma volta ao redor da Terra, etc. Isso corresponde a aproximadamente 29,5 dos nossos dias. Doze desses períodos é um ano lunar com, portanto, 354 dos nossos dias.
A adoção de 12 ciclos provavelmente decorreu de influência dos babilônios (habitantes do atual Iraque – que tragédia!), que adotavam o sistema sexagesimal com um calendário de 12 meses lunares, arredondando cada mês para 30 dias. O ano para os babilônios, portanto, correspondia a 360 dias.
A influência da base 60 dos babilônios persiste até hoje nas medições angulares e na divisão da hora. A própria divisão do dia em 24 horas é também conseqüência da base 60.
E qual era o problema da adoção desses sistemas?
A encrenca com esses e outros sistemas, que não o referenciado ao sol, é que ao longo do tempo se perdia a correspondência com as estações do ano. Era, exagerando, como se, com o passar do tempo, um dado dia do ano previsto para o verão caísse em pleno inverno. As férias de um sorocabano em Mongaguá poderiam cair na época de um frio medonho. Já pensou? Bermudão, chinelos de dedo, camiseta regata, bóia e um baita frio. Nem pensar!
Teoricamente, se não houvesse a tal sazonalidade, qualquer sistema de marcação de tempo poderia ser arbitrado. É por causa das estações que até hoje fazemos uma correção no calendário de quatro em quatro anos, nos tais anos bissextos.
Os gregos que adotaram o calendário lunar já sabiam dessa falha e periodicamente adicionavam meses para a concatenação com as estações, o que também era feito pelos babilônios.
O problema da inclusão de meses adicionais para acertos é que ela era feita por “sacerdotes”, cheios de poder político e vaidade, como sói acontecer... E, como todo poder perverte, as coisas ficavam arbitrárias. Muitas vezes as correções eram esquecidas e virava uma bagunça com chiadeiras, sobretudo dos agricultores.
Daí concluirmos que as mutretas vêm de longe... São, em essência, atávicas na humanidade.
A mesma coisa acontecia com o calendário romano, que inicialmente era lunar, com 304 dias divididos em dez meses, de março a dezembro. Naquela época, o ano começava em primeiro de março. Posteriormente, Numa Pompilius (715-673 a.C.) acrescentou mais dois meses – janeiro e fevereiro –, fez alterações e estabeleceu o ano com 354 dias.
Tarquinius Priscus (616-579 a.C.), por superstição aos números pares, deu um dia a mais a janeiro e o sistema passou a ser de um ano com doze meses e 355 dias.
Posteriormente, Julio César, influenciado pela cultura egípcia, promoveu nova reforma, que foi realizada pelo astrônomo alexandrino Sosígenes. Adotou-se então um calendário com 365,25 dias do ano solar (365 dias mais um quarto de um dia).
A diferença de 6 horas entre o ano solar e o ano civil adotado era ajustada de 4 em 4 anos, repetindo-se o dia 24 do mês de fevereiro, que na época tinha 29 dias. Esses anos de 366 dias chamam-se bissextos porque os romanos repetiam o dia 24 de fevereiro "bis VI antediem calendas martias". Simplificadamente “bis VI”, ou “bissextum”. Daí a origem do ano bissexto – duas vezes o sexto dia antes do início de março – e não, como muita gente atribui, ao duplo seis em 366.
O começo do ano mudou de 1o de março para 1o de janeiro. Mudou-se também o nome do antigo quinto mês do ano, "quintilius", para julho (Julius) em homenagem a Júlio César, e mais tarde o sexto mês, "sextilius", passou para o que hoje é agosto (Augustus) em homenagem a Otávio César Augusto. Como julho tinha 31 dias, por razões políticas o mês de agosto passou a ter também 31 dias, com a diminuição de um dia de fevereiro, que ficou, em anos normais, com 28 dias.
Todavia, o tal do calendário juliano era maior que o ano solar em 11minutos e 14 segundos (um ano solar ou trópico tem 365 dias, 5 horas, 48 minutos e 45,5 segundos, que, para facilitar o entendimento, vamos considerar como o período que corresponde à revolução da Terra em torno do Sol).
Para corrigir esse erro entre o ano solar e o ano civil, que no ano de 1582 já era de 10 dias, o Papa Gregório XIII, pela sua Bula Inter Gravissimas de 24 de fevereiro de 1582, ordenou a reforma do Calendário para um ano trópico de 365,2425 dias.
Com essa reforma, permanecem os anos bissextos de 4 em 4 anos (fevereiro com 29 dias, como o do ano de 2004). Todos os anos seculares são anos normais (1700, 1800, 1900, etc.), exceto os divisíveis por 400 (1600, 2000, etc.), que são anos bissextos.
Foi para promover essa correção que o dia seguinte a 4 de outubro de 1582 (quinta-feira) passou a ser o dia 15 de outubro de 1582 (sexta-feira), como comentamos inicialmente.
Todavia, o calendário que usamos não é absolutamente exato. Daqui a uns 3000 anos haverá uma diferença de um dia!
Adalberto Nascimento
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